domingo, 27 de julho de 2014

Como me usaram para tirar o Neymar da Copa.

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Nada como começar uma sexta-feira com uma bela apunhalada nas costas.

Dramas menores a parte, mas como ando realmente com um sentimento de que alguém lá em cima adora tirar uma onda com a minha cara, o que me resta é encarar a coisa com um pouco de humor e sarcasmo. Afinal, como diria mestre Yoda "para ninguém, fácil está".

Como já relatei sou transplantado duplo (pâncreas/rim) desde outubro de 2013. De lá pra cá venho num processo de readaptação a várias coisas. Não parece, mas tenho dois órgãos dentro de mim que eram de outro ser humano e isso não funciona como um simples "plug and play".  A verdade é que uma cirurgia desse porte lhe trás efetiva qualidade de vida a partir de 1 ano. Ou seja, para mimainda não chegou totalmente.

Claro que não preciso mais tomar injeções de insulina de 3 a 5 vezes por dia, nem mesmo ficar ligado a uma máquina de hemodiálise por 4 horas 3 vezes por semana. Já isso vale qualquer esforço de uma cirurgia de transplante e tempo de recuperação tomando milhares de comprimidos. Mas muitas coisas podem acontecer no pós operatório só que a gente não fica muito preparado pra elas. Meio que liga no automático e "vai". Mas vai daquele jeito né.

No começo deste ano apareceu um problema neurológico que me tirou a força da mão esquerda e depois a firmeza nas pernas. E também meu pé direito está tipo anestesiado desde então. Caminho normalmente na maioria das vezes mas não é difícil ter de utilizar de uma bengala para caminhadas mais longas. Correr ou dar um pequeno salto que seja é risco de ir ver o chão bem de perto. Ao ir na Arena da Baixada ver jogos da Copa aqui em Curitiba, quando me empolgava com a torcida em comemorar um gol, era um salto e em seguida uma sentada pois não conseguia manter o equilíbrio pra continuar de pé. Dançar? Melhor não arriscar.  Quanto a mãe esquerda a coisa é mais complicada. Imagine tudo o que você faz comas duas mãos. Mas faça agora usando somente os dedos mindinho e o seu-vizinho da mão esquerda (se for canhoto, inverta a mão). Abotoar camisa ou a calça, amarrar calçados, lavar a louça, cortar algum alimento usando garfo e faca (você usa a força do braço sobre a faca e quem vê acha que você esta esquartejando um boi), segurar algo mais pesado ... enfim. É complicado. Falando assim você até pode achar que não é pra tanto, face eu comentar isso com algumas pessoas e elas fazerem cara de paisagem. Tenta aí e depois me fala, só não vale trapacear.

Depois de uns dois diagnósticos de neurologistas que não convenceram muito procurei outro indicado por minha médica do transplante a dra Fabíola idolatrada salve-salve. Sério gente, ela é demais. Então fui ter com o neuro que disse pra fazer um exame chamado liquor. É uma punção lombar que tira líquido da espinha pra ver se o sistema nervoso está com processo infeccioso e que esteja causando essas alterações. Aí que entra a apunhalada nas costas.

Anestesia local. Fica sentado. E "puff". Sua coluna é espetada por uma agulha que deve ter uns 10 centímetros. Era a mesma sexta-feira do jogo do Brasil contra a Colombia. Tirando a sensação de desconforto até que não doeu. O médico disse pra tomar paracetamol e café se doesse e repousar. Beleza. Deu tempo de chegar em casa e ver o segundo tempo de Alemanha e França e se preparar pra torcer pelo Neymar.

Mas aí a anestesia foi passando  E eu ia me curvando pra tornar aquela dorzinha mais simpática. Aí que descobri que meu neuro era alemão. Ele fez vudu em mim e no jogo do Brasil ... creck ... quebrou a vértebra do Neymar. Desgraçado, por que ele não usou uma rã ao invés da MINHA coluna? Punção na coluna dos outros é refresco. Dois paracetamol na boca e vou tentar dormir. Acordo as 4h da manhã urrando de dor. Não tinha posição que me fizesse não ter a sensação de que a agulha ainda estava na minha espinha. Paracetamol, compressa de água quente e até café forte ...nada. Sete da manhã serviço de emergência batendo na minha porta. Injeção de tramal no músculo e comprimido de Tylex, que tem morfina na fórmula, pra sobreviver ao final de semana. Com picos de melhora e de "deixe eu sair deste corpo que eu não pertenço", assim fui de Tylex de 8 em 8 horas que acabaram sendo de 4 em 4 hs. Eu até pensei em tentar ir ver uma semi-final em São Paulo. Mas assim como o Neymar eu também estava fora da Copa. Na terça feira pra consulta de retorno com o resultado do exame: BINGO, claro que meus nervos estão infeccionados. 

Reclamei de boa como dr Fritz (nome fictício) que ele podia ter avisado do pior quadro da pós punção. E se ele não tinha dó de ter feito o que fez com o Neymar EM MIM. Podia ter receitado o que o Neymar tomou que dois dias depois estava andando e até carregando mochila nas costas. Piadas a parte, vão fazer 20 dias que saí de 10mg diários de cortisona para 60mg. Estou um pouco mais inchado, com o rosto levemente vermelho, com mais fome e até agora com mãos e pernas do mesmo jeito: tudo ainda estragado sem melhorar nada. 

É cada uma que parecem cinco e ainda tento rir. A debilidade nas mãos me evitam de exercer atividade profissional pelo qual estou de licença. E a gente vive. A gente vai se adaptando até a hora que não dá mais. De uns dias pra cá voltei a sentir dores nas costas. Mais para o lado direito como uma pontada dependendo da posição que faça. Talvez uma nevralgia retardatária em função da dor da punção. 

Entre um gemido de dor ou outro coloco um sorriso maroto na cara e vou vivendo e curtindo o que é possível. A dor tem todo o direito de nos desafiar. Mas o sofrimento nunca pode nos vencer. E quando precisar grite uns bons palavrões pelo ar de vez em quando em alto e bom som. Só pra deixar claro quem é que manda.

2 comentários:

  1. Rênato meu querido, fico triste em saber que está tendo estas complicações! quando esteve aqui eu vi sua dificuldade com a mão e torcia que tivesse melhorando. È incrível que ainda consiga extrair algum humor desta fase tão difícil, talvez tentando NOS confortar e para dizer que não nos preocupemos com vc! te admiro muito por isto, além de ser um sagitariano especial - como humildemente somos todos - vc ainda veio com um plus de nos fazer ver a vida melhor! torcendo por vc ! sempre! um beijão!

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    1. Obrigado meu querido. "Não tá morto quem peleia, mas óia que tá acabando as bala". Se bem que me conheço,cato umas pedras no chão e vai na pedrada mesmo. rsrsrs. Sua empatia tão nobre me alegra. Valeu mesmo. Bjão.

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