quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Transplante já deu certo e a vida há de dar também.


Entre tantos meses coloridos, setembro foi verde, o mês da doação de órgãos,e no último dia 27 foi o dia nacional da doação de órgãos instituído pelo ministério da saúde (eu nem sei quem é o ministro atual mas deve ser do PMDB).

Sendo eu um transplantado minha médica, Dra Fabíola Pedron a qual agradeço e admiro muito, sabendo de meu blog me convidou a escrever algo sobre a doação de órgãos e os benefícios que isso trás a quem espera na fila de transplantes e a nova vida que tem após ser agraciado pela doação. Agradeci o convite e disse que escreveria algo e logo publicaria sobre a experiência que tive. Bem,o mês passou e acabei escrevendo algo só agora pois percebi que especificamente no meu caso relatar sobre a doação de órgãos, como a maioria de amigos sabe é preciso uma reflexão bastante profunda e escolher as palavras certas que só não exaltem o ato da doação mas também não causem aflição a quem aguarda por uma doação. Para mim o transplante deu certo mas a vida ainda não.

O processo que me levou ao transplante levou em torno de dois anos. Na verdade começou mais cedo, em 2009 quando precisei tirar o rim direito por um processo de hidronefrose. Depois disso o rim esquerdo começou a apresentar fadiga. Em 2012 sintomas se agravaram. A creatinina já estava em 7,0 e apresentava constante incomodo estomacal com asia e ânsias constantes, múltiplas alergias e dermatites. Em janeiro de 2013 entrei na fila para tx duplo de rim e pâncreas (devido a diabetes juvenil). Havia aí a esperança ainda de conseguir doador antes de inciar a difícil vida de fazer hemodiálise. Um amigo chegou a fazer teste de compatibilidade o que deu 100% compatível mas como a vida é a vida ele acabou não dando prosseguimento  Isso não me abalou e continuo tempo por ele o mesmo carinho e apreço que sempre tive. Doar um rim não é como pagar um McDonalds pra um amigo que está duro naquele dia.

Sem previsão de sair o transplante já tinha feito 3 cirurgias no braço pra fazer a fístula preparando-me pra eventual hemodiálise mas nenhuma tinha dado certo. A creatinina foi a 8,4 e o hemodiálise chegou. No começo fiz com cateter no pescoço, Fiz uma 4a cirurgia no braço e a fístula então funcionou. Acordava 3x por semana as 5 e meia da manhã, cruzava a cidade, me filtrava por 4 horas e depois ia trabalhar  Tinha dias que não dava, mas mesmo quando dava chegava umas 4 da tarde eu estava em petição de miséria. Não tinha mais energia. Em outubro de 2013 fui contemplado como tx duplo vindo de um rapaz que havia falecido de acidente na cidade de Pato Branco, interior do estado. Já contei aqui como foi esse processo então vou passar adiante (consulte ao lado textos a partir de outubro de 2013).

Enquanto eu fazia hemodiálise pensava muito em coisas que eu não ia mais poder fazer. A vida é sempre agora; O futuro é um desejo, uma esperança. Então eu achava que quem doa um órgão não doa só um coração, um rim etc.Doa perspectivas, horizontes e emoções. Quem doa um rim, doa uma comemoração regada a champagne, um capuccino ao cair da tarde; quem doa um coração doa uma corrida até o filho, doa uma noite de amor inesquecível com muito suor; quem doa o pâncreas doa um strogonoff de nozes, uma torta banoff, a sobremesa da ceia de Natal, o brigadeiro do aniversário de criança; quem doa córneas doa um por do sol, doa alpes suíços, castelos da Alemanha, doa a Beija-Flor na avenida; quem doa o pulmão doa um mergulho, doa um beijo demorado de tirar o folego; quem doa um órgão mais que vida doa viver.



Eu não seria eu se não viesse aqui dar um recadinho especial a quem aguarda na fila por um transplante ou mesmo para aqueles já são transplantados mas ainda estão na luta pra alcançar a vida normal. A rapadura é doce mas é dura.

O transplante em si não é uma solução imediata para todas as agruras para quem tem um órgão "made in china". A recuperação as vezes é demorada. Eu mesmo estou prestes a completar 2 anos de transplante e ainda não estou todo recuperado. Tive muitas intercorrências devido a baixa imunidade entre elas problemas neurológicos que afetaram coordenação motora que tem melhorado com tratamento específico. Eu chego lá. São coisas que, não necessariamente, podem fazer parte da recuperação (relatos de transplantados aqui). Mas são situações que deviam ser mais detalhadas ao paciente.

Mas para mim ainda é bastante forte a ideia que apesar dos riscos o transplante é a solução mais viável. Não se deixa de fazer o bolo porque talvez um ovo possa estar estragado; não se deixa de ir ao show do Queen porque talvez chova; não se deixa de tomar champagne, ter uma noite de amor, comer brigadeiro, ver o por do sol ou mergulhar por conta de algo que está além do certo e irrestrito. Viver é o certo. 

4 comentários:

  1. Olha, vou te dizer uma coisa para vc! Eu tenho muito orgulho de poder me considerar seu amigo, além de ser sagitariano (um destaque em seu currículo sem duvida) e escrever super bem, vc é uma pessoa muito sensível e talentosa! um beijão!

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  2. E dizem que ser sensível é ser frágil.....BLÁ, BLÁ, BLÁ...
    Ser sensível é uma das maiores forças que o ser humano dispõe.
    É na fragilidade do corpo ( e da alma ) que reside toda uma vida.
    Dói, machuca, fere e deixa cicatrizes, mas sente-se vivo!
    Obrigado por ser meu amigo e por ter a capacidade de dividir essa experiência!
    bjs

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  3. Meu filho de apenas 14 anos e hoje faz oito dias que fez o TX renal

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  4. Meu filho de apenas 14 anos e hoje faz oito dias que fez o TX renal

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